O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) criou um esquema bilionário para obter apoio do Congresso na última eleição que elegeu seus candidatos.
Segundo reportagem do jornal O Estado de S. Paulo, o chefe do Executivo reservou um orçamento secreto de R$ 3 bi em emendas, boa parte delas destinada à compra de tratores e equipamentos agrícolas por preços até 259% acima dos valores de referência fixados pelo governo.
A reportagem encontrou o orçamento em um conjunto de 101 ofícios enviados por deputados e senadores ao Ministério do Desenvolvimento Regional e órgãos vinculados para indicar como eles preferiam usar os recursos.
Os documentos mostram que o esquema atropela leis orçamentárias, pois são os ministros que deveriam definir onde aplicar os recursos, e dificulta o controle do Tribunal de Contas da União (TCU) e da sociedade. Os acordos para direcionar o dinheiro não são públicos, e a distribuição dos valores não é equânime entre os congressistas, atendendo a critérios eleitorais.
O senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), que contou com o apoio do Planalto para eleger Rodrigo Pacheco, determinou a aplicação de R$ 277 milhões de verbas públicas só do Ministério do Desenvolvimento Regional, assumindo a função do ministro Rogério Marinho.
Ele precisaria de 34 anos no Senado para conseguir indicar esse montante por meio da tradicional emenda parlamentar individual, que garante a cada congressista direcionar livremente R$ 8 milhões ao ano.
Ao deputado federal Lúcio Mosquini (MDB-RO), o governo aceitou pagar R$ 359 mil em um trator que, pelas regras normais, somente liberaria R$ 100 mil dos cofres públicos. No total, o deputado direcionou R$ 8 milhões.
Os deputados do Solidariedade Ottaci Nascimento (RR) e Bosco Saraiva (AM) direcionaram R$ 4 milhões para Padre Bernardo (GO), cidade a cerca de dois mil quilômetros de seus redutos eleitorais, para máquinas agrícolas. Se a tabela do governo fosse considerada, a compra sairia por R$ 2,8 milhões.
As máquinas são destinadas a prefeituras para auxiliar nas obras em estradas nas áreas rurais e vias urbanas e também nos projetos de cooperativas da agricultura familiar. Políticos costumam promover festas de entrega dos equipamentos, o que lhes garante encontros e fotos com potenciais eleitores em ano pré-eleitoral.
Ao serem entrevistados, deputados e senadores negavam o direcionamento dos recursos ou se recusavam a prestar informações. Confrontados com ofícios assinados por eles e a planilha do governo, acabaram por admitir seus atos.
Na prática, a origem do novo esquema está no discurso de Bolsonaro de não distribuir cargos, sob o argumento de não lotear o primeiro escalão do governo. De um jeito ou de outro, a moeda de troca se deu por meio da transferência do controle de bilhões de reais do orçamento ao Congresso. Tudo a portas fechadas, longe do olhar dos eleitores.